Você conhece as anfisbênias?

As anfisbênias são conhecidas como cobra-cega e cobra-de-duas cabeças. Embora semelhantes as serpentes e apresentarem características comuns aos lagartos, pertencem a uma família a parte (Amphisbaenidae). O seu nome possui raízes gregas, e está relacionado ao fato de sua cabeça e cauda serem muito semelhantes, o que aparenta uma capacidade de se movimentar para frente e para trás, onde amphi (duplo) e baen (caminhar). De hábito fossorial (vivem embaixo da terra), é de difícil observação na natureza o que dificulta o encontro de exemplares para estudos em laboratórios de pesquisa.

No Brasil são conhecidos três gêneros, que distinguem-se principalmente pelo formato da cabeça: o gênero Amphisbaena em sua maioria apresenta um cabeça mais arredondada, vivendo geralmente mais próxima a superficie; Leposternon apresenta uma cabeça em forma de pá, adaptada para a escavação de solos compactados e mais profundos; e Mesobaena com cabeça achatada lateralmente.

 

Onde vivem?

Encontradas em galerias no solo (possui hábito fossorial), que constroem com movimentos da cabeça. Suas adaptações para uma vida embaixo da terra a tornam um organismo interessante para estudos de adaptações à condições extremas.

 

Características

Para conseguir sobreviver no interior da terra desenvolveu uma cabeça rígida, corpo cilíndrico, rígido e alongado e ausência de patas na maioria das espécies. Sua cauda é forte e curta, e possui a mesma espessura do corpo, onde tem-se a impressão de possuir uma outra cabeça no lugar da cauda. Seus olhos são de tamanho reduzido, visto que não possuem grande importância em meio ao solo. Seu corpo é composto de escamas pequenas e lisas, formando anéis ao redor do corpo para facilitar o rastejamento e a locomoção em meios aos túneis no solo. Não possuem veneno (não são peçonhentas).

 

Defesa

Para se defender de predadores são capazes de desprender parte da cauda, que se move rapidamente por vários minutos entretendo o predador, dando um tempo ágil para o animal conseguir fugir. Ao contrário do que ocorre nos lagartos, não consegue regenerar o pedaço faltante. Outro comportamento de defesa comunente observado é, quando ameaçada, levantar a cabeça e a cauda ao mesmo tempo, confundindo o predador de que parte atacar e possibilitando tempo para defesa.

 

Ecologia

De maneira geral, sua ecologia e reprodução são pouco conhecidas. De hábito fossorial, são raramente avistadas, sendo um dos grupos de Squamata menos conhecidos. Com dentes fortes e uma mandíbula potente, alimentam-se de insetos, vermes e até pequenos vertebrados. Para localizar suas presas utilizam o olfato e vibrações no solo.

 

Papel Ecológico e Ameaças

Assim como as minhocas, contribuem para para a penetração de água e ar no solo devido a sua escavação permanente, favorecendo o crescimento de vegetação. Sua aparência os confudem com serpentes e devido ao medo, quando encontrados sobre o solo após uma chuva ou durante escavação de um pedaço de terra, geralmente são mortos. Ainda, o enchimento de represas durante a criação de usinas hidrelétricas faz com que o solo seja alagado e os animais subam a superfície, o que tem permitido a descrição de diversas novas espécies. Isso chama a atenção ao fato de que as alterações impostas ao meio ambiente pelas atividades humanas podem fazer com que espécies desapareçam sem que tenham sido estudadas ou, pior, sequer registradas.

 

Distribuição

Espécies deste grupo são encontradas em diversas partes do globo, distribuídas no sul da Europa, oeste da Ásia, África, América do Norte, América do Sul e Antilhas. Possui alto endemismo no Cerrado, contanto com 32 espécies com registro no bioma, sendo 20 consideradas endêmicas.

Grande parte das espécies são conhecidas de apenas um ponto de registro (muitas coletadas durante o enchimento de represas) ou um número limitado de registros, o que dificulta o conhecimento da real distribuição das espécies.

 

Amphisbaena absaberi (Strüssmann & Carvalho, 2001)

Conhecida apenas da localidade de sua descrição, no município de Cáceres, estado do Mato Grosso. No local, foi coletada durante um operação com escavadeira em área alterada. Alimenta-se de formigas e besouros e aparentemente se reproduz na estação chuvosa. Pode chegar à 300 mm de comprimento do rosto até a cloaca.

 

Amphisbaena acrobeles (Ribeiro, Castro-Mello & Nogueira, 2009)

            Espécie descrita através de um indivíduo mutilado durante a instalação de uma armadilha de coleta de répteis em região de cerrado típico na Área de Proteção Ambiental Jalapão, estado do Tocantins. No estômago foram encontrados cupins.

 

Amphisbaena alba (Linnaeus, 1758)

            É a espécie de anfisbênia com maior distribuição conhecida e uma das maiores da região Neotropical, chegando até 735 mm de comprimento do rosto até a cloaca. Ocorre em todo os países da América do Sul exceto Argentina, Chile e Equador. Mesmo preferindo áreas florestadas, é encontrada desde áreas bem preservadas até ambientes alterados pela presença humana. Sua reprodução é sazonal pode botar até oito ovos. Apresenta coloração amarelada com ventre branco.

 

Amphisbaena anaemariae Vanzolini, 1997

Espécie endêmica do Cerrado, preferindo áreas de florestas secas, mas com registros em áreas impactadas pela presença humana. Atinge até 145 mm de comprimento do corpo.

 

Amphisbaena bedai (Vanzolini, 1991)

            Pouco conhecida, possui três registros no estado de Mato Grosso do Sul e um registro isolado no estado da Bahia. Atinge aproximadamente 300 mm de comprimento do corpo.

 

Amphsbaena bilabialata (Stimson, 1972)

            Espécie com vários exemplares coletados durante o enchimento da Pequena Central Hidrelétrica Agropecuária Rio Von den Steinen, em ambiente florestado no Cerrado, no estado do Mato Grosso. Pode chegar a 307 mm de comprimento do corpo.

 

Amphisbaena brevis Strussmann & Mott, 2009

Encontrada em região de pastoreio, no município de Chapada dos Guimarães no estado do Mato Grosso. Seu entorno foi convertido em lago da Usina Hidrelétrica de Manso. Pode chegar a 139 mm de comprimento do corpo.

 

Amphisbaena camura Cope, 1862

Com registro no Brasil apenas no estado do Mato Grosso do Sul, ocorre na Argentina, Paraguai e Bolívia. Atinge até 535 mm de comprimento total.

 

Amphisbaena carli Pinna et al., 2010

Possui registro em ambiente arenoso, próximo a plantação de Pinus sp., com três registros no estado do Piauí e um no estado da Bahia. Atinge até 264 mm de comprimento do rosto até a cloaca.

 

Amphisbaena crisae Vanzolini, 1997

            Conhecida de apenas duas localidades, uma no estados de Mato Grosso e outra no Mato Grosso do Sul. Pode atingir até 264 mm de comprimento total.

 

Amphisbaena cuiabana (Strüssmann & Carvalho, 2001)

            Possui registros nos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Alimenta-se de formigas, besouros e gafanhotos. Sua ninhada é de até dois ovos. Atinge até 234 mm de comprimento corporal.

 

Amphisbaena dubia Müller, 1924

Espécie noturna, com preferencia para ambientes florestais no Cerrado e Mata Atlântica. Possui registros nos estados de Santa Catarina, São Paulo e Minas Gerais. É ovípara, com registro de até três ovos por ninhada.

 

Amphisbaena ibijara Rodrigues, Andrade & Lima, 2003

Espécie registrada em ambientes arenosos e em plantação de Eucalyptus no estado do Maranhão. Atinge até 238 mm de comprimento total.

 

Amphisbaena kraoh (Vanzolini, 1971)

Com poucos registros, é conhecida de três localidades, uma no estado do Maranhão e duas no estado de Tocantins.

 

Amphisbaena leeseri Gans, 1964

Espécie encontrada nos estados de Rondônia, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás e Tocantins, com registros no Paraguai.

 

Amphisbaena mensae Castro-Mello, 2000

            Encontrada na porção central do Brasil, nos estados de Mato Grosso, Goiás e Minas Gerais e no Distrito Federal. Pode atingir até 120 mm de comprimento do rosto até a cloaca.

 

Amphisbaena mertensii Strauch, 1881

            Com ampla distribuição, ocorre na Argentina e Paraguai. No Brasil, está presente em ambientes preservados e alterados do Cerrado e Mata Atlântica nos estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Minas Gerais, São Paulo, Paraná e Santa Catarina.  Sua ninhada pode chegar até oito ovos.

 

Amphisbaena miringoera Vanzolini, 1971

            De tamanho diminuto comparada a outras espécies do grupo, foi registrada em apenas três localidades em diferentes estados: Mato Grosso, Pará e Piauí.

 

Amphisbaena neglecta Dunn & Piatt, 1936

            Possui registro em apenas duas localidades, no estado de Mato Grosso e outra no estado de Goiás. Pode chegar até 150 mm de comprimento total.

 

Amphisbaena prunicolor (Cope, 1885)

            Ocorre no estado de Espírito Santo e na região sul do Brasil, Paraguai e Argentina. Atinge até 238 mm de comprimento do corpo.

 

Amphisbaena roberti (Gans, 1964)

            Presente no Cerrado e Mata Atlântica, nos estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Tocantins, Bahia, Espírito Santo, Minas Gerais, São Paulo e Paraná e no Paraguai. Há registros de até seis ovos por ninhada. Pode atingir até 268 mm de comprimento do corpo.

 

Amphisbaena sanctaeritae Vanzolini, 1994

            Possui registro apenas para a localidade que foi descrito, em região de mata seca no bioma Cerrado, no município de Santa Rita do Passa Quatro, estado de São Paulo. Atinge comprimento corporal de até 185 mm.

 

Amphisbaena saxosa (Castro-Mello, 2004)

            Possui distribuição restrita a duas localidades no estado de Tocantins, coletados na região da Usina Hidrelétrica Luís Eduardo Magalhães.

 

Amphisbaena silvestrii Boulenger, 1902

            Espécie com registro na Bolívia e Brasil. Ocorre em ambientes  florestados e savânicos do Cerrado, nos estados de Tocantins, Mato Grosso e Goiás. Pode chegar até 163 mm de comprimento do corpo.

 

Amphisbaena steindachneri Strauch, 1881

Possui registros apenas para o Brasil, nos estados do Rondônia e Mato Grosso.

 

Amphisbaena vermicularis Wagler, 1824

            Presente em diferentes biomas (Cerrado, Caatinga e Mata Atlântica) e com registros em áreas alteradas, ocorre na Bolívia e no Brasil, nos estados do Pará e Maranhão. Alimenta-se de formigas, besouros e cupins. Estudos registraram até quatro ovos por ninhada. Atinge até 252 mm de comprimento do corpo.

 

Amphisbaena talisiae Vanzolini, 1995

Descrita e conhecida apenas da Serra da Pitomba, município de Barra do Garças, estado de Mato Grosso.

 

Leposternon cerradensis Ribeiro, Vaz-Silva & Santos, 2008

            Encontrada durante o enchimento da represa da Usina Hidrelétrica de Espora, município de Aporé, estado de Goiás. Possui apenas seis indivíduos conhecidos e pode atingir até 317 mm de comprimento do corpo.

 

Leposternon infraorbitale (Berthold, 1859)

            Presente no Distrito Federal e em diversos estados brasileiros, no Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Bahia, Minas Gerais, Espírito Santo, Tocantins, Acre e Rondônia. Alimenta-se de besouros e cupins e  sua ninhada é de até 10 ovos.

 

Leposternon kisteumacheri Porto, Soares & Caramaschi, 2000

            Possui registros apenas em solos arenosos de florestas secas decíduas dos estados brasileiros de Minas Gerais e Bahia.

 

Leposternon microcephalum Wagler, 1824

            Espécie com ampla distribuição, ocorre na Bolívia, Paraguai, Argentina e Uruguai em diferentes ambientes e biomas. No Brasil, possui registros nos estados de Mato Grosso do Sul, Goiás, Bahia, Pernambuco (Ilha de Fernando de Noronha), Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Santa Catarina. Atinge até 275 mm de comprimento do corpo.

 

Leposternon polystegum Duméril, 1851

            Ocorre em ambientes preservados e alterados nos biomas Mata Atlântica, Caatinga e Cerrado, nos estados do nordeste do Brasil (exceto Paraíba), Pará, Tocantins, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Alimenta-se de formigas, cupins e larvas de besouro. Estudo registrou uma ninhada de seis ovos. Atinge em média 35 mm de comprimento do corpo. Possui coloração amarelada e escama rostral achatada em forma de pá.